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Sep 04, 2023

Acusações de trabalho escravo voltam a assombrar a Volkswagen no Brasil

Promotores no Brasil estão buscando reparações por décadas de violações de direitos humanos supostamente cometidas pela Volkswagen na Amazônia durante a ditadura militar.

Os jovens foram seduzidos com falsas promessas de trabalho decente e um campo de futebol de verdade para jogar. A realidade revelou-se muito diferente: condições de trabalho exaustivas e repressivas às quais estavam presos pela servidão por dívidas.

Essa foi a experiência de centenas de trabalhadores rurais que foram submetidos ao trabalho análogo ao escravo nas décadas de 1970 e 1980 na fazenda Vale do Rio Cristalino, no Pará, um estado no norte do Brasil que abrange parte da Amazônia. O dono da fazenda era a Volkswagen do Brasil, subsidiária brasileira da montadora alemã.

Quase meio século depois, promotores no Brasil estão buscando indenizações pelas vítimas da escravidão moderna na fazenda da Volkswagen. Suas acusações de violações dos direitos humanos são apoiadas por um vasto corpo de evidências. Mas a Volkswagen rejeita todas as acusações e nega ser responsável pelo uso de trabalho escravo em sua fazenda. Em março deste ano, a empresa desistiu das negociações com o Ministério Público.

O caso ilumina o relacionamento amigável da Volkswagen com os governos militares que governaram o Brasil durante a ditadura de 1964-1985 – e como esses governos facilitaram todos os tipos de abusos socioambientais. Ele também destaca os desafios em responsabilizar corporações poderosas.

A Fazenda Volkswagen na Amazônia

Em 1973, a Volkswagen adquiriu cerca de 140 mil hectares de terras em Santana do Araguaia, sul do Pará, com o objetivo de transformar a floresta em pasto para gado. A empresa buscava uma forma fiscalmente vantajosa de investir os lucros da indústria automobilística e nutria a ambição de desenvolver uma raça de gado otimizada. Teve a bênção e o incentivo do governo militar, para quem esse projeto de pecuária se encaixou em sua política de desenvolvimento agressivo da Amazônia.

Sob o lema nacionalista "integrar para não entregar", os governos militares supervisionaram a construção de estradas que cortam a Amazônia e apoiaram a criação de fazendas extensas como a fazenda Vale do Rio Cristalino, da Volkswagen, tudo com o objetivo de de povoar e monetizar a floresta tropical.

Essa política desenvolvimentista foi destrutiva. Teve um alto preço socioambiental, aproveitando a exploração dos brasileiros pobres, levando a um genocídio indígena e dando início ao desmatamento em larga escala que assola a Amazônia até hoje - tudo financiado pelo contribuinte brasileiro, já que empresas como a Volkswagen foram generosamente subsidiadas para suas atividades amazônicas.

A Volkswagen recebeu R$ 700 milhões em valor atual (cerca de US$ 140 milhões) do governo brasileiro por meio de deduções de impostos e outros benefícios fiscais, de acordo com estimativas dos promotores hoje. “E esses recursos foram usados ​​para derrubar a floresta, criar danos ambientais, violar leis trabalhistas e usar trabalho escravo”, diz Ricardo Rezende, padre católico e antropólogo que denunciou a Volkswagen pela primeira vez há 40 anos.

No entanto, o rancho tornou-se um empreendimento perdedor em 1980 e a Volkswagen decidiu vendê-lo em 1986.

"Uma Realidade Brutal e Violenta"

Rezende mudou-se para o Pará em 1977, quando trabalhava na Comissão Pastoral da Terra, entidade ligada à Igreja Católica. Ele diz que imediatamente começou a receber denúncias de trabalho escravo e assassinatos ocorridos nas fazendas da região, pertencentes a grandes corporações. Uma delas foi a fazenda Volkswagen.

Em 1983, três trabalhadores conseguiram fugir da fazenda e relatar os abusos que sofreram e testemunharam ali. Rezende tornou públicas as acusações contra a Volkswagen.

“Os trabalhadores foram punidos, receberam falsas promessas em alguns dos municípios mais pobres do Brasil e foram traficados para dentro da fazenda e, ao chegar lá, se depararam com uma realidade extremamente brutal e violenta”, diz Rafael Garcia, procurador que lidera a atual investigação sobre as violações dos direitos humanos da Volkswagen.

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